As artes que abandonei

No final do ano passado (e início desse ano), me rendi aos inúmeros comentários sobre livros de autoajuda (ou mais ou menos isso) mais descontraídos e resolvi começar a leitura de dois livros: A Arte de Pedir, da maravilhosa Amanda Palmer; e A Sutil Arte de Ligar o F*oda-se, do Mark Manson, ambos publicados pela editora Intrínseca.

Porém, para o meu espanto, nenhuma das leituras vingou e eu acabei deixando esses livros de lado. 

Vale fazer resenha de livros abandonados? Eu digo que vale.


 A Arte de Pedir, Amanda Palmer

Desdobramento inevitável da palestra homônima, o livro A arte de pedir trata essencialmente de recorrer ao outro, sem temor, sem vergonha e sem reservas. Por que não pedimos ajuda, dinheiro, amor, com a mesma naturalidade com que pedimos uma cadeira vazia num restaurante ou uma caneta, na rua, para fazer uma anotação? Pedir é digno e necessário, e é a conexão entre quem dá e quem recebe que enriquece a vida humana, defende Amanda. Longe de ser um manual sobre como pedir, o livro é uma provocação bem-vinda e urgente, que incita o leitor a superar seus medos e admitir o valor de precisar e doar ajuda, sempre.

Amanda Palmer tem uma das vidas mais interessantes que alguém pode ter. Ela trabalhava como estátua humana em um cruzamento principal da Harvard Square, deixava qualquer ser humano entrar na sua casa para "compartilhar momentos e experiências", gravou o primeiro CD totalmente financiado com um projeto de  crowdfunding e se casou com um dos maiores escritores de ficção da atualidade. Ela também é especialista em destrinchar as coisas simples que se tornam uma grande questão na nossa vida. É como se ela pegasse todos os motivos de crise e overthinking dos millennials e os jogasse em cima da mesa: expostos, esmiuçados, explicados, quase resolvidos.

Mesmo assim, em determinado ponto, o livro começa a ficar repetitivo demais e eu me vi ansiosa por qualquer parte que falasse um pouco mais sobre o Niel Gaiman (marido da Amanda), só para fugir dos discursos "acredite em mim" e "eu vejo você".

Acredito que o principal aspecto que me fez abandonar o livro foi o excesso de referência às crises e dilemas dos millennials. Todo esse discurso jorra em toneladas na internet e eu simplesmente não aguento mais. É uma tremenda hipocrisia da minha parte criticar essa geração porque, bom, eu faço parte dela. Mas estou em um momento em que eu queria muito poder deixar todos esses aspectos de lado e só viver. Fazer coisas. Produzir. Manter as coisas simples. Sem grandes reflexões, nem grandes críticas. Apenas viver.

Ah, e também teve um fato importante: Amanda Palmer ama pessoas. E eu não compartilho intensamente desse amor.

- Palestra da Amanda Palmer para o TED Talks (que eu super recomendo)
- Compre o livro (caso minha opinião tenha te deixado mais curiosa do que desmotivada)

A Sutil Arte de Ligar o F*oda-se, Mark Manson

Mark Manson usa toda a sua sagacidade de escritor e seu olhar crítico para propor um novo caminho rumo a uma vida melhor, mais coerente com a realidade e consciente dos nossos limites. E ele faz isso da melhor maneira. Como um verdadeiro amigo, mark se senta ao seu lado e diz, olhando nos seus olhos: você não é tão especial. Ele conta umas piadas aqui, dá uns exemplos inusitados ali, joga umas verdades na sua cara e pronto, você já se sente muito mais alerta e capaz de enfrentar esse mundo cão. Para os céticos e os descrentes, mas também para os amantes do gênero, enfim uma abordagem franca e inteligente que vai ajudar você a descobrir o que é realmente importante na sua vida, e f*da-se o resto. Livre-se agora da felicidade maquiada e superficial e abrace esta arte verdadeiramente transformadora.

Nesse caso, sei exatamente o que fez com que todo mundo gostasse do livro menos eu: Mark Manson é o cara que diz o que todo mundo quer ouvir. Todo o discurso é muito bonito, mas muitas vezes é contraditório. Sabe quando você está de dieta e quer comer um doce? Mark é o cara que diz "Foda-se essa dieta, seja feliz, coma esse doce! Qual é o impacto maior na sua vida? Nenhum! Permita-se ser feliz" logo nas primeiras páginas. Porém, lá pelo meio do livro, ele também diz que "Você deve saber quais são suas prioridades. A dieta é sua prioridade? Então faça a dieta! Lute, resista! Assim você vai alcançar todos os seus sonhos".

O autor não mente quando diz isso. Tudo é relativo, suas decisões dependem do momento e do contexto nas quais elas estão sendo tomadas. No entanto, ele coloca isso de uma maneira maquiada e feita para soar genial; coisa que tem me dado ranço, não só em livros de autoajuda mas em todos os textões politizados da internet. Todos são donos de uma verdade incrível que vai mudar o mundo,  mas nenhuma dessas verdades é novidade, muito menos fácil de praticar. A Arte de Ligar o F*da-se é mais um daqueles livros bonitinhos, cheios de frases ótimas para anotar na agenda, mas rasos em conteúdo.

- Compre o livro (caso você queira tirar umas fotos bacanas pro Instagram) 


Desde que li Girl Boss (da Sophia Amoruso) fiquei com a impressão de que todos esses livros de autoajuda e cases de sucesso compartilham a mesma estrutura: um início rico, cheio de frases de efeito e ensinamentos marcantes; um meio morno, extremamente repetitivo e recheado com clichês e um final previsível, pouco impactante, onde a emoção mais forte que se sente é o alívio (porque finalmente o livro acabou). Infelizmente, nenhum desses dois livros foi capaz de me provar o contrário.

Será que fiquei com birra do gênero? Não sei dizer.

Talvez eu só esteja com birra de tudo.

Você leu esses livros? O que achou deles? Vamos conversar nos comentários (e no twitter, me segue lá).

Comentários

  1. Engraçado que eu nunca tinha lido um livro de auto ajuda, e pasme! Li as primeiras páginas do primeiro agora a pouco. E me deparo com sua postagem. Será um sinal de que não irei gostar? Porque sempre compartilhei dos mesmos pensamentos que os seus sobre. sos

    www.acessopermitido.com

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  2. bom, vou ser sincera. por partes:
    adorei que você fez resenhas de livros não terminados, porque não foram concluídos por algum motivo, e isso é importante.
    detesto autoajuda, até já li mais nova, fiquei "nossa", mas quando lembro percebo que essas coisas (para mim num geral, para quem gosta talvez eu esteja sendo injusta) comovem demais e, como você disse, é dizer o que o outro quer ouvir. geralmente para vender, acredito que seja um dos caminhos mais curtos para o sucesso e esteja imbuído de marketing.
    eu gosto e admiro pessoas que 'venceram na vida', mas geralmente tem muita meritocracia envolvida. e sou absolutamente contra o pensamento "quem quer, consegue. é só se esforçar".
    sobre o segundo livro, eu sempre odiei a frase-título, porque nunca consegui ligar o foda-se como 300 pessoas a minha vida inteira me aconselharam. eu nem gosto de conselhos! e eles falam com uma naturalidade como se fosse fácil como piscar os olhos. é algo que não existe no meu universo. então revirei os olhos quando vi a propaganda, mas nem sabia absolutamente a sinopse. e vindo aqui eu percebo que não leria nenhum dos dois mesmo.

    mas é porque eu, como disse ali em cima, não gosto de conselhos. para mim eles, se ajudam, é menos de 15% das vezes. e autoajuda tem muito conselho. muitos como se deve fazer, pensar, agir. e as pessoas naturalmente (inclusive eu) buscam muito passos prontos a se seguir. fórmulas prontas, para resolver isso logo e partir para o próximo problema, querendo resolver como se fosse um ticar de checklist.

    me desculpe o comentário e todo o seu conteúdo, mas o modo que você escreveu seu post me fez ter confiança em desabafar tudo isso sem temer possíveis e prováveis represálias.

    e preciso reescrever esses trechos aqui, porque concordo DEMAIS:

    "Todos são donos de uma verdade incrível que vai mudar o mundo, mas nenhuma dessas verdades é novidade, muito menos fácil de praticar."

    "Amanda Palmer ama pessoas. E eu não compartilho intensamente desse amor."

    um beijo! e perdoa mesmo se passei dos limites nas críticas

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  3. Eu achei muito legal você resenhar livros não-acabados porque o que mais vejo por aí (sentimento que eu partilho) é uma vergonha geral de abandonar livros que não gostamos, tornando-se uma vergonha quando isso acontece. O que é ridículo porque terminando ou não, podemos ter uma opinião formada sobre o livro.

    Ainda não li esse livro da Amanda Palmar, mas também não pretendo mais justamento por sentir que é um livro que todo mundo já postou na internet as lições importantes de vulnerabilidade que ela apresenta e, sim, livros de autoajuda tornam-se BEM repetitivos quando vai chegando da metade para o final. Já a Sutil arte de ligar o foda-se foi um dos primeiros livros que li e adorei, o livro tá todo grifado, acho que caiu nas minhas mãos em um momento certo da minha vida. Tem certas auto-ajudas que simplesmente fazem bem pra gente. Foi o meu caso.

    Não li Girlboss e perdi a vontade por causa do seriado e ter achado a Sophia uma pessoa odiosa hehe socorro

    beijo :)

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  4. "Amanda Palmer ama pessoas. E eu não compartilho intensamente desse amor."
    Acabei de soltar uma risada muito alta no trabalho, hahahaha.
    Adorei essas resenhas de livros abandonados. É interessante saber porque as pessoas abandonam os livros (as vezes é mais importante do que uma resenha terminada).
    Eu gostei de A Arte de Pedir, mas acho que é porque gosto muito da Amanda Palmer.
    E o segundo eu coloquei no kindle e li até uns 20%, mas estou em dúvida se termino ou não. Sempre tento tirar lições de tudo que eu faço/leio e gostei bastante de uns trechos do começo do livro sobre não ligar para tudo que acontece, mas ainda não cheguei na parte onde ele se contradiz.

    E também sinto que existe essa estrutura nos livros. Fico imaginando o autor entregando 100 páginas para a editora e o editor falando: preciso de pelo menos mais 100. Ai a pessoa volta para casa e fica igual a gente em resposta de prova que não sabe a resposta, escrevendo a mesma coisa com 5 frases diferentes para ver se cola.

    Saudades dos seus posts <3

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  5. Oi Natália! Não, eu não li nenhum dos dois livros ~ e confesso que tenho um pouco de ranço desse gênero. Aliás, outro dia percebi numa livraria que eles tinham trocado o nome 'autoajuda' por 'autoconhecimento'. Imagino que para tentar tirar um pouco do lado pejorativo da expressão. Curioso.

    Eu também estou um pouco cansada dessas pessoas "iluminadas" que decidem compartilhar o seu profundo conhecimendo do mundo (e o segredo da felicidade). Do escritor premiado a sua vizinha de porta, todos têm histórias e conselhos que, supostamente, vão te ajudar a alcançar o sucesso e a autorrealização. Não rola pra mim... :/

    Beijo, beijo :*

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  6. Preciso dizer que amei sua sinceridade em relação aos livros.
    Eu tbm tentei me jogar no gênero ano passado, mas acho que não estava pronta pra isso.
    Confesso que ainda estou curiosa pera arte de ligar o f*da-se hahahahah

    Sai da Minha Lente

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  7. Oi Natália!!

    Nunca li livros de autoajuda, aliás eu não sou muito de ler livros, infelizmente. Acho que eu compraria o livro do Mark só para tirar fotos mesmo Kkkkk
    Achei legal você mostrar os motivos que levaram você abandonar os livros. E compartilho da mesma opinião: "Ah, e também teve um fato importante: Amanda Palmer ama pessoas. E eu não compartilho intensamente desse amor." XD Quando li essa frase, ri bastante kkk
    Bom, quem sabe eu leia esse Girl Boss. Eu conheço vagamente pelo nome. Você poderia fazer uma resenha dele para que eu possa ter uma ideia, que tal?

    Beijos e até mais~~^^*
    Ps: Obrigada pela no meu blog. Desculpa pela demo

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  8. Eu amei esse post e espero que vire algo ocasional no seu blog.
    Li o da Amanda em 2015 e eu concordo com tudo que você disse, mas também concordo que na época eu era uma pessoa MUITO diferente. Sabe, muitas pessoas que admiro gostam desse livro dela e por isso fica a vontade de querer reler pra saber até onde li errado ou se realmente não bateu e tudo bem... Eventualmente, vou acabar relendo e quem sabe me ajude ou me inspire, mas no momento, eu também achei umas coisas demais. Uma forçação de barra que eu não tô acostumada e coisas positivas/roots ao ponto de chegar a ser irritante. Disse a minha eu de 2015, hahaha.

    www.paleseptember.com

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  9. miga, vou te falar do fundo do coração: insiste na Arte de Pedir! eu também achei repetitivo e em muitas partes fiquei OK EU JA ENTENDI, mas terminar a leitura, concluir, junto com a Amanda, amarra tudo bem bonitinho no final e te deixa com uma sensação de tudo faz sentido, sabe?

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  10. Hahaha tive essas mesmas impressões quando fui ler um livro desse estilo, chamado "Unmistakable: Why Only Is Better Than Best". O autor faz analogias interessantes e algumas frases que dão vontade de colar na parede do quarto, mas também passa boa parte do tempo citando fulanos que deram certo na vida, mas eu não tenho nem ideia de quem são.
    Tenho mania de abandonar livros, bom saber que não sou a única.

    do cristal

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  11. Achei digno você fazendo resenha até de livros que abandonou, haha. Tá valendo, né, porque tu tem algo a dizer.
    Nossa, eu NÃO CONSIGO me interessar por esse tipo de literatura. Muita gente do meu ciclo na internet morre de amores pelo livro da Amanda Palmer mas eu só sei sentir preguiça... Nem planejo tentar, sinceramente, quando tem tanta ficção na fila. ;)

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  12. E o blog? Não vai mais voltar??? Eu tenho vários livros sobre quais abandonei também, as vezes por preguiça outras por falta de tempo mesmo.

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